quarta-feira, 6 de junho de 2012

O perdedor

Aquele cara é um perdedor.

Eu sei disso. Todo mundo sabe disso. O psicopata da mesa do lado sabe disso. Existe algo naquele cara que grita para todos os burgueses chatos sentados neste café exatamente o que ele é: um perdedor. Por um momento, ele acha que não está tão na cara. Tenta disfarçar o sujo de macarrão com bolonhesa da camiseta com um pouco de saliva. Ele faz isso meticulosamente, delicadamente, como se tentasse esconder de todo mundo a sua ignorância. 

Ele se sente deslocado, como um andarilho de bairros vizinhos. Ele tem algumas moedas no bolso e um cigarro pendurado atrás da orelha. Neste exato momento, ele olha pela janela e faz um gesto como se tivesse esquecido algo em casa. Ele se sente um idiota.

O que aquele cara não sabe é que todas as pessoas daquele café do sul de Nova Iorque são completos idiotas. Até mesmo o advogado sentado à minha frente conversando com uma senhora de chalé azul-esverdeado. Todos eles são peças de um tabuleiro. Todos são pequenas articulações para a montagem de uma única peça: a vida.

Sinto um repuxo quando observo o perdedor saindo da cafeteria sem pagar o cappuccino que agora esfria em cima da mesa à minha diagonal. A garçonete está muito ocupada tentando arranjar algumas gorjetas de um velho usando terno inglês que não tira os olhos de seus peitos. Vejo um cara entreabrir devagar a porta da cafeteria. Ele não a abre a 90 graus que é para o sino não tocar. Tem as mãos sujas de graxa e alguma coisa enfiada entre a calça e o cinto que lhe dá um jeito de andar engraçado. Ele senta no bar e pede uma Coca-Cola com limão, um croissant de chocolate e um milk-shake de morango.

Eu sei o que vai acontecer. Todo mundo sabe disso. O psicopata da mesa do lado levanta-se e vai embora deixando uma nota de 5 dólares na mesa. Instantaneamente, eu o sigo. Eu sei o que vai acontecer, o perdedor sabia o que ia acontecer, o psicopata também. Quando chego à esquina escuto gritos e atravesso o sinal aberto me deliciando com as probabilidades que matei hoje. Eu não paguei o café. Eu não perdi os 29,35 dólares que tinha na carteira. 

O perdedor ganhou mais do que vocês.

(...)

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